quarta-feira, 26 de novembro de 2008

O temível Bundossauro




Tenho um sobrinho que vive contando historinhas. Aliás, nisto ele não difere de nenhuma criança ou político: estes e aqueles vivem inventando histórias mirabolantes. Uns por invenção criativa e engraçada. Outros por falta de escrúpulos. Meu sobrinho, obviamente, por imaginação criativa.
Pois bem. Certa feita, a professora pediu às crianças da turminha do Jardim da Infância que contassem uma história. Algo deste tipo. Eis que, milhões de anos depois, surgiu, vindo da infantil, criativa e fértil mente de meu sobrinho, o ferocíssimo bundossauro. Bundossauro... Bem pensado, meu sobrinho. Bundossauro.
Em tempos como os nossos em que mulheres, depois de tantos anos de luta por respeito e reconhecimento, recebem a terrível carga de desvalorização de, acreditem, mulheres-fruta, mulheres-coisa (atenção: o segundo substantivo especifica o primeiro e, por isso, apenas o primeiro termo é flexionado), não é tão difícil perceber a existência de um animal tão feroz, desprovido de amor próprio e absolutamente vulgar dançado nas televisões, aparecendo em revistas e sites pornôs.
Bundossauro... atraente, crescido, arredondado, aparentemente inofensivo, mas trazendo em si uma carga de preconceito e desvalorização incalculável. Terrível este tal de Bundossauro. Nascido na esperançosa e pueril mente, o nome parece feito sob medida para uma gama de atitudes nada infantis que pretende preservar, através da superexposição do corpo, a mulher subjugada, reificada, coisificada.
Expor, submeter, dominar fingindo adorar... o Bundossauro cumpre seu papel. Bundossauro.... bem pensado, meu sobrinho, bem pensado.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Outro testamento


Oráculo do Senhor:
Respostas que não tenho
São proibições que te faço,
Medos que tenho
São os prazeres de teu regaço

Oráculo do Senhor:
Agora quem fala sou eu
E me tenho como
Testemunha
Do caos que me habita.

Oráculo do Senhor:
O que falas em tua defesa?
O que podes falar
Em minha presença?
O que és senão meu suspiro?
O que és senão meu medo?

Oráculo do Senhor:
Resposta que não tenho
Medo da sua eternidade.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Sem culpa

Pequei, Senhor,
Confesso
Minha culpa.
Lençóis, sombra,
A pele clara...
Confesso, Senhor,
A minha carne.
A carne forte,
Doce e sem espírito, Senhor, assexuado e bom.
Pequei, Senhor,
Violando a luxúria alheia,
Os pecados dela
E seus demônios...
Pequei, Senhor, assexuado e bom,
Porque, mesmo depois de amar,
Amei.

domingo, 2 de novembro de 2008

...


Encarcerado nas grades de açúcar,
Pena coração...
O que é não sei,
Mas dói, e mata,
E faz rir, e faz viver.
Daqui vejo outras flores...
Mas há grades!
Doces, grades, doces grades.
As flores não atinjo, não toco
E delas sinto o cheiro...
Vejo, não toco.
Morro para as flores,
Beijo-me como se as fosse.
Recolho-me por trás das grades
E vivo como se as fosse.